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Dia dos Mortos em Portugal homenageia José Saramago no seu Centenário

Este mês, a Embaixada do México em Lisboa e a Red Global MX Portugal, colaboraram na organização das comemorações do Dia dos Mortos no Centro Comercial UBBO em Lisboa. Como parte desta celebração fomos igualmente convidados para ir ao canal nacional português TVI apresentar como o dia dos mortos é celebrado no México. Falámos sobre os costumes, a comida e como a morte é interpretada pelos Mexicanos.

Todos os anos, e como parte da tradição mexicana neste dia festivo mundialmente famoso, homenageámos pessoas do México e de Portugal que tiveram grande influência nas nossas vidas e que não estão mais connosco, dedicando-lhes o altar dos mortos com objetos especiais, alguns pessoais, alusivos a eles. Nesta ocasião especial homenageámos o escritor e fotógrafo mexicano Juan Rulfo, e de Portugal homenageámos José Saramago no centenário do seu nascimento (16 de novembro, 1922).

Neste dia de festa, contámos com a especial presença de Pilar Del Rio, mulher que partilhou a vida com José Saramago, e que agora dedica o seu trabalho a divulgar o seu espólio, à frente da Fundação José Saramago. Foram também apresentadas danças tradicionais Mexicanas, que cativaram a audiência que passava no Centro. Ficámos surpreendidos pela receção e carinho com que a cultura Mexicana foi recebida.

De todos os feriados tradicionais no México, o Dia dos Mortos é o que mais gosto porque não é uma celebração patriótica com desfiles militares que comemoram alguma conquista ou batalha. É sim uma celebração humana, inclusiva, plural, secular e de igualdade, que, pode ser celebrada por todos, em todo o mundo, e que nos une em fraternidade à inevitável finitude, que faz parte do ser humano. A morte.

José Saramago diz que para morrer basta estar vivo. No seu romance “Todos os Nomes”, há uma cena de profundo significado quando a personagem principal chamada José vai ao cemitério à procura do túmulo de uma mulher que investiga. O guarda do cemitério pergunta: “Queres ter a certeza de que ela morreu?” E José responde: “Não, quero ter a certeza de que ela viveu.” É verdade, a morte é a certeza de que a vida foi dada porque o ato de morrer é exclusivo dos vivos.

Neste Dia dos Mortos escolhemos José Saramago como a figura portuguesa a homenagear no altar porque este é um ano especial, pois celebramos o seu centenário. Estamos muito gratos a Pilar del Rio e à Fundação Saramago por nos emprestarem alguns valiosos objetos pessoais e da Fundação para decorar este altar dos mortos. No altar tivemos uma máquina de escrever que pertenceu a Saramago, alguns retratos, livros e outros artefactos alusivos ao autor.

Relembramos e celebramos José Saramago com carinho e gratidão não só por ser um grande escritor e livre-pensador empenhado na humanidade e na natureza, um incansável promotor da leitura, da participação democrática e dos direitos humanos, mas também porque José Saramago era um grande amigo do México, país do qual gostava muito, onde forjou muitas amizades, e que visitou muitas vezes dando conferências, apresentando livros e promovendo o ativismo social em prol dos direitos humanos e dos direitos dos povos indígenas no México.

Para o México, José Saramago é uma figura de grande importância porque os seus romances e pensamento crítico foram muito bem recebidos tendo uma grande influência no pensamento e na atuação de muitos

Ricardo Villarreal

Mas foi também no México que um grupo de intelectuais, convocado pela Fundação Saramago e pela UNAM, escreveu um documento importante inspirado no discurso de Saramago após receber o Prémio Nobel, onde denunciou a violação dos Direitos Humanos. Esse documento viria a materializar-se como a “Carta Universal dos Deveres e Obrigações das Pessoas”, tendo sido entregue ao Secretário-Geral das Nações Unidas, em 2018, para complementar a Declaração dos Direitos Humanos. Um assunto sempre importante para o escritor.

Pensando que o lado oposto da morte seria viver e desfrutar o presente, no seu livro “Viagem a Portugal”, temos Saramago como guia numa viagem deliciosamente mágica, completa, cheia de história e cor por este lindo país que é Portugal. Mas, para Saramago, viajar não é deslocar-se constantemente de um lugar para outro para somar destinos visitados. Trata-se de “ser mais e andar menos”. Sentir-se mais vivo do que nunca, estar conscientemente presente onde estamos durante a viagem, que pode ser a da própria vida, e, nesse transe, desfrutar da experiência de viver e viajar, que é uma das muitas faces que a felicidade tem.

Altar do Dia dos Mortos em Portugal

E a felicidade também está noutro tema recorrente de Saramago: no amor. O amor é essa experiência intensa que nos faz acreditar na imortalidade. Quem já sentiu a magia explosiva de um primeiro beijo e a forma como nos faz flutuar sem sentido, nos perdendo num sonho hipnotizante do qual nunca queremos acordar, sabe como é o amor verdadeiro. Romances como “A caverna”, ” As Intermitências da Morte “, “Memorial do convento” e “Todos os nomes”, entre outros, são apenas alguns dos livros clássicos onde Saramago narra o incansável tema do amor com sua fascinante lucidez narrativa.

No final do livro “Viagem a Portugal”, Saramago também diz, “o fim de uma viagem é apenas o começo de outra.” Neste Dia dos Mortos, lembrar aqueles que partiram é uma forma de mantê-los vivos e a melhor maneira de prestar homenagem a um escritor que nos deu um legado maravilhoso é lendo e comentando a sua obra.

E para muitos que já o leram, este Centenário de José Saramago é uma oportunidade para voltar a mergulhar no seu vasto universo para revalidar os seus pensamentos face aos desafios do mundo de hoje e autoavaliar o significado humano que damos à nossa existência.

Ricardo Villarreal, Vicepresidente – Red Global MX Capítulo Portugal

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